Dīgha Nikāya 15

Mahānidana Sutta

O Grande Discurso da Origem Dependente

Assim ouvi. Certa ocasião o Abençoado estava entre os Kurus em uma cidade denominada Kammasadhamma, então o Venerável Ānanda foi até o Abençoado e depois de cumprimentá-lo sentou a um lado e disse:

“É maravilhoso e admirável, venerável senhor, que essa origem dependente seja tão profunda e difícil de ser vista, no entanto para mim ela parece tão simples, clara como a luz do dia.”

“Não diga isso, Ānanda! Não diga isso, Ānanda! Esta origem dependente é um ensinamento profundo, difícil de ser visto. É por não entender, não compreender e não penetrar de forma completa este ensinamento que os seres ficam confusos como um novelo embaraçado, como uma corda embolada cheia de nós, como juncos enredados, e não conseguem escapar da transmigração, dos planos de miséria, dos destinos ruins, dos mundos inferiores.

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O envelhecimento e morte surgem devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o envelhecimento e morte?’ a resposta deveria ser: ‘Com o nascimento como condição surge o envelhecimento e morte.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O nascimento surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o nascimento?’ A resposta deveria ser: ‘Com o ser/existir como condição surge o nascimento.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O ser/existir surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o ser/existir?’ A resposta deveria ser: ‘Com o apego como condição surge o ser/existir.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O apego surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o apego?’ A resposta deveria ser: ‘Com o desejo como condição surge o apego.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O desejo surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o desejo?’ A resposta deveria ser: ‘Com a sensação como condição surge o desejo.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘A sensação surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge a sensação?’ A resposta deveria ser: ‘Com o contato como condição surge a sensação.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘O contato surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge o contato?’ A resposta deveria ser: ‘Com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge o contato.’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘A mentalidade-materialidade (nome e forma) surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge a mentalidade-materialidade (nome e forma)?’ A resposta deveria ser: ‘Com a consciência como condição surge a mentalidade-materialidade (nome e forma).’

“Ānanda, se alguém for perguntado: ‘A consciência surge devido a uma condição específica?’ A resposta deveria ser: ‘Sim.’ Se alguém for perguntado: ‘Através de qual condição surge a consciência?’ A resposta deveria ser: ‘Com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge a consciência.’

“Portanto Ānanda, com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge a consciência; com a consciência como condição surge a mentalidade-materialidade (nome e forma); com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge o contato; com o contato como condição surge a sensação; com a sensação como condição surge o desejo; com o desejo como condição surge o apego; com o apego como condição surge o ser/existir; com o ser/existir como condição surge o nascimento; e com o nascimento como condição surgem o envelhecimento e morte, tristeza, lamentação dor, angústia e desespero. Essa é a origem de toda essa massa de sofrimento.

Envelhecimento e Morte

“Foi dito: ‘Com o nascimento como condição surge o envelhecimento e morte.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum nascimento de qualquer tipo em nenhum lugar—isto é, de devas no mundo dos devas, fantasmas famintos, demônios, seres humanos, quadrúpedes, animais com asas e répteis, cada um no seu próprio mundo—se não houvesse nenhum nascimento de seres de qualquer tipo em nenhum mundo, então, com a completa ausência de nascimento, com a cessação do nascimento, haveria como discernir o envelhecimento e morte?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o envelhecimento e morte, isto é, o nascimento.

Nascimento

“Foi dito: ‘Com o ser/existir como condição surge o nascimento.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum ser/existir de qualquer tipo em nenhum lugar, isto é, não houvesse ser/existir no reino da esfera sensual, ser/existir no reino da forma, ou ser/existir no reino sem forma—então, com a completa ausência de ser/existir, com a cessação do ser/existir, haveria como discernir o nascimento?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o nascimento, isto é, o ser/existir.

Ser/existir

“Foi dito: ‘Com o apego como condição surge o ser/existir.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum apego de qualquer tipo em nenhum lugar, isto é, nenhum apego a prazeres sensuais, apego a idéias, apego a preceitos e rituais ou apego a idéias da existência de um eu—então, com a completa ausência do apego, com a cessação do apego, haveria como discernir o ser/existir?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o ser/existir, isto é, o apego.

Apego

“Foi dito: ‘Com o desejo como condição surge o apego.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum desejo de qualquer tipo em nenhum lugar, isto é, nenhum desejo por formas visíveis, desejo por sons, desejo por aromas, desejo por sabores, desejo por tangíveis ou desejo por objetos mentais—então, com a completa ausência do desejo, com a cessação do desejo, haveria como discernir o apego?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o apego, isto é, o desejo.

Desejo

“Foi dito: ‘Com a sensação como condição surge o desejo.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma sensação de qualquer tipo em nenhum lugar, isto é, nenhuma sensação originada do contato no olho, nenhuma sensação originada do contato no ouvido, nenhuma sensação originada do contato no nariz, nenhuma sensação originada do contato na língua, nenhuma sensação originada do contato no corpo, nenhuma sensação originada do contato na mente—então, com a completa ausência da sensação, com a cessação da sensação, haveria como discernir o desejo?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o desejo, isto é, a sensação.

Dependente do Desejo

“Então, Ānanda, na dependência do desejo surge o apego; na dependência do apego surge a busca; na dependência da busca surge o ganho; na dependência do ganho surge a decisão; na dependência da decisão surge o desejo e cobiça; na dependência do desejo e cobiça surge o apego; na dependência do apego surge a posse; na dependência da posse surge a mesquinharia; na dependência da mesquinharia surge a salvaguarda; e devido à salvaguarda, muitos fenômenos ruins e prejudiciais surgem—tomar clavas e armas, conflitos, brigas e disputas, linguagem ofensiva, difamação e falsidades.

“Foi dito: ‘Devido à salvaguarda, muitos fenômenos ruins e prejudiciais surgem—tomar clavas e armas, conflitos, brigas e disputas, linguagem ofensiva, difamação e falsidades.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma salvaguarda de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência de salvaguardas, com a cessação de salvaguardas, aqueles vários fenômenos ruins e prejudiciais surgiriam?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para aqueles vários fenômenos ruins e prejudiciais, isto é, as salvaguardas.

“Foi dito: ‘Na dependência da mesquinharia surge a salvaguarda,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma mesquinharia de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência da mesquinharia, com a cessação da mesquinharia, haveria como discernir a salvaguarda?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a salvaguarda, isto é, a mesquinharia.

“Foi dito: ‘Na dependência da posse surge a mesquinharia’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma posse de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência da posse, com a cessação da posse, haveria como discernir a mesquinharia?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a mesquinharia, isto é, a posse.

“Foi dito: ‘Na dependência do apego surge a posse,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum apego de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência do apego, com a cessação do apego, haveria como discernir a posse?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a posse, isto é, o apego.

“Foi dito: ‘Na dependência do desejo e cobiça surge o apego,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum desejo e cobiça de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência do desejo e cobiça, com a cessação do desejo e cobiça, haveria como discernir o apego?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o apego, isto é, o desejo e cobiça.

“Foi dito: ‘Na dependência da decisão surge o desejo e cobiça.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma decisão de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência da decisão, com a cessação da decisão, haveria como discernir o desejo e cobiça?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o desejo e cobiça, isto é, a decisão.

“Foi dito: ‘Na dependência do ganho surge a decisão,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum ganho de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência do ganho, com a cessação do ganho, haveria como discernir a decisão?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a decisão, isto é, o ganho.

“Foi dito: ‘Na dependência da busca surge o ganho,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhuma busca de qualquer tipo em nenhum lugar, então, com a completa ausência da busca, com a cessação da busca, haveria como discernir o ganho?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o ganho, isto é, a busca.

“Foi dito: ‘Na dependência do desejo surge a busca,’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum desejo de qualquer tipo em nenhum lugar—isto é, nenhum desejo por prazeres sensuais, desejo por existir ou desejo por não existir—então, com a completa ausência do desejo, com a cessação do desejo, haveria como discernir a busca?

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a busca, isto é, o desejo.

“Assim, Ānanda, esses dois fenômenos, sendo uma dualidade, convergem para uma unidade na sensação.

Sensação

“Foi dito: ‘Com o contato como condição surge a sensação.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se não houvesse absolutamente e completamente nenhum contato de qualquer tipo em nenhum lugar, isto é, nenhum contato no olho, nenhum contato no ouvido, nenhum contato no nariz, nenhum contato na língua, nenhum contato no corpo, nenhum contato na mente—então, com a completa ausência do contato, com a cessação do contato, haveria como discernir a sensação?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a sensação, isto é, o contato.

Contato

“Foi dito: ‘Com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge o contato.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se aquelas qualidades, sinais, detalhes e indicadores, através dos quais há a conceituação de um corpo mental (atividade mental), estiverem todas ausentes, haveria como discernir o contato de designação no corpo material, (corpo físico)?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Se aquelas qualidades, sinais, detalhes e indicadores, através dos quais há a conceituação de um corpo material, estiverem todas ausentes, haveria como discernir o contato de colisão no corpo mental?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Se aquelas qualidades, sinais, detalhes e indicadores, através dos quais há a conceituação de um corpo mental e de um corpo material, estiverem todas ausentes, haveria como discernir ou o contato de designação, ou o contato de colisão?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Se aquelas qualidades, sinais, detalhes e indicadores, através dos quais há a conceituação da mentalidade-materialidade (nome e forma), estiverem todas ausentes, haveria como discernir o contato?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para o contato, isto é, a materialidade (nome e forma)-mentalidade.

Mentalidade-materialidade (nome e forma)

“Foi dito: ‘Com a consciência como condição surge a mentalidade-materialidade (nome e forma).’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se a consciência não se estabelecesse no ventre da mãe, a mentalidade-materialidade (nome e forma) se estabeleceria no ventre?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

“Se, após se estabelecer no ventre, a consciência fosse embora, a mentalidade-materialidade (nome e forma) seria gerada nesse novo ser?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

“Se a consciência de um jovem ou uma jovem fosse interrompida, a mentalidade-materialidade (nome e forma) cresceria, se desenvolveria e alcançaria a maturidade?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para mentalidade-materialidade (nome e forma), isto é, a consciência.

Consciência

“Foi dito: ‘Com a mentalidade-materialidade (nome e forma) como condição surge a consciência.’ Isso, Ānanda, deve ser compreendido desta forma: Se a consciência não pudesse se estabelecer na mentalidade-materialidade (nome e forma), haveria como discernir a origem dessa massa de sofrimento de futuros nascimentos, envelhecimento e morte?”

“Com certeza não, venerável senhor.”

“Então, Ānanda, essa é a causa, a fonte, a origem e condição para a consciência, isto é, a mentalidade-materialidade (nome e forma).

“Essa é a extensão, Ānanda, na qual há o nascimento, envelhecimento, morte, falecimento e renascimento. Essa é a extensão na qual há meios de designação, de linguagem, de conceituação. Essa é a extensão na qual se estende a esfera para a sabedoria, a extensão na qual o ciclo gira para a manifestação (discernimento) deste mundo, isto é, a mentalidade-materialidade (nome e forma) junto com a consciência.

Descrições do Eu

“De que formas, Ānanda, alguém descrevendo o eu, o descreve? Descrevendo o eu como tendo forma e finito, ele o descreve assim: ‘Meu eu possui forma e é finito.’ Ou descrevendo o eu como tendo forma e infinito, ele o descreve assim: ‘Meu eu possui forma e é infinito.’ Ou descrevendo o eu como sem forma e finito, ele o descreve assim: ‘Meu eu é sem forma e finito.’ Ou descrevendo o eu como sem forma e infinito, ele o descreve assim: ‘Meu eu é sem forma e infinito.”

“Nesse sentido, Ānanda, aquele que descreve o eu como tendo forma e finito, ou ele descreve esse eu [como apenas existindo] no presente, ou ele o descreve com tal natureza que este irá [naturalmente] se tornar possuído de forma e finito [no futuro/após a morte], ou ele acredita que 'Embora ainda não seja desse modo, eu o converterei de modo que seja assim.' Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como tendo forma e finito está por trás disso.

“Aquele que descreve o eu como tendo forma e infinito ou ele descreve esse eu… (igual acima). Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como tendo forma e infinito está por trás disso.

“Aquele que descreve o eu como sem forma e finito ou ele descreve esse eu… (igual acima). Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como sendo sem forma e finito está por trás disso.

“Aquele que descreve o eu como sendo sem forma e infinito ou ele descreve esse eu [como apenas existindo] no presente, ou ele o descreve com tal natureza que este irá [naturalmente] se tornar possuído de forma e finito [no futuro/após a morte], ou ele acredita que 'Embora ainda nao seja desse modo, eu o converterei de modo que seja assim.'. Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como sendo sem forma e infinito está por trás disso.

“É dessa forma, Ānanda, que alguém descrevendo o eu, o descreve.

Não Descrições do Eu

“De que forma, Ānanda, alguém não descrevendo o eu, não o descreve? Não descrevendo o eu como tendo forma e finito, ele não o descreve assim: ‘Meu eu possui forma e é finito.’ Ou não descrevendo o eu como tendo forma e infinito, ele não o descreve assim: ‘Meu eu possui forma e é infinito.’ Ou não descrevendo o eu como sem forma e finito, ele não o descreve assim: ‘Meu eu é sem forma e finito.’ Ou não descrevendo o eu como sem forma e infinito, ele não o descreve assim: ‘Meu eu é sem forma e infinito.”

“Nesse sentido, Ānanda, aquele que não descreve o eu como tendo forma e como finito, não descreve esse eu [como apenas existindo] no presente, nem o descreve com tal natureza que este irá [naturalmente] se tornar possuído de forma e finito [no futuro/após a morte], nem acredita que 'Embora ainda não seja desse modo, eu o converterei de modo que seja assim.' Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como tendo forma e finito não está por trás disso.

“Aquele que não descreve o eu como tendo forma e infinito, não descreve esse eu… (igual acima). Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como tendo forma e infinito não está por trás disso.

“Aquele que não descreve o eu como sendo sem forma e finito, não descreve esse eu… (igual acima). Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como sendo sem forma e limitado não está por trás disso.

“Aquele que não descreve o eu como sendo sem forma e infinito, não descreve esse eu [como apenas existindo] no presente, nem o descreve com tal natureza que este irá [naturalmente] se tornar possuído de forma e finito [no futuro/após a morte], nem acredita que 'Embora ainda nao seja desse modo, eu o converterei de modo que seja assim.' Em sendo assim, pode ser apropriado dizer que uma idéia estabelecida [de um eu] como sendo sem forma e infinito não está por trás disso.

“É dessa forma, Ānanda, que alguém não descrevendo o eu, não o descreve.

Pressuposições do eu

“De que formas, Ānanda, alguém pressupondo [a idéia de] um eu, o pressupõe? Alguém que pressupõe [a idéia de] um eu, ou pressupõe a sensação como o eu, dizendo: ‘A sensação é o meu eu.’ Ou ele pressupõe: ‘A sensação não é o meu eu; meu eu não experimenta sensações.’ Ou ele pressupõe: ‘A sensação não é o meu eu, mas o meu eu não está sem a experiência da sensação. Meu eu sente; pois o meu eu está sujeito à sensação.’

“Nesse sentido, Ānanda, aquele que diz ‘A sensação é o meu eu’ deveria ser perguntado: ‘Amigo, existem esses três tipos de sensação: sensação prazerosa, sensação dolorosa e sensação nem prazerosa, nem dolorosa. Desses três tipos de sensação, qual delas você considera como o eu?’

“Ānanda, na ocasião em que alguém experimenta uma sensação prazerosa, ele, naquela mesma ocasião, não experimenta uma sensação dolorosa, ou uma sensação nem prazerosa, nem dolorosa; naquela ocasião ele experimenta apenas uma sensação prazerosa. Na ocasião em que alguém experimenta uma sensação dolorosa, ele, naquela mesma ocasião, não experimenta uma sensação prazerosa, ou uma sensação nem prazerosa, nem dolorosa; naquela ocasião ele experimenta apenas uma sensação dolorosa. Na ocasião em que alguém experimenta uma sensação nem prazerosa, nem dolorosa, ele, naquela mesma ocasião não experimenta uma sensação prazerosa, ou uma sensação dolorosa; naquela ocasião ele experimenta apenas uma sensação nem prazerosa, nem dolorosa.

“Ānanda, a sensação prazerosa é impermanente, condicionada, com origem dependente, sujeita à destruição, a decair, desaparecer e cessar. A sensação dolorosa é impermanente, condicionada, com origem dependente, sujeita à destruição, a decair, desaparecer e cessar. A sensação nem prazerosa, nem dolorosa é impermanente, condicionada, com origem dependente, sujeita à destruição, a decair, desaparecer e cessar.

“Se, ao experimentar uma sensação prazerosa, alguém pensa: ‘Este é o meu eu,’ então com a cessação daquela sensação prazerosa ele pensaria: ‘Meu eu desapareceu.’ Se, ao experimentar uma sensação dolorosa, alguém pensa: ‘Este é o meu eu,’ então com a cessação daquela sensação dolorosa ele pensaria: ‘Meu eu desapareceu.’ Se, ao experimentar uma sensação nem prazerosa, nem dolorosa, alguém pensa: ‘Este é o meu eu,’ então com a cessação daquela sensação nem prazerosa, nem dolorosa ele pensaria: ‘Meu eu desapareceu.

“Assim aquele que diz ‘A sensação é o meu eu’ pressupõe como eu algo que, até mesmo no aqui e agora, é impermanente, uma mistura de prazer e dor e sujeito ao surgimento e à cessação. Por conseguinte, Ānanda, devido a isso não é aceitável que se pressuponha: ‘A sensação é o meu eu.’

“Ānanda, aquele que diz ‘A sensação não é o meu eu; meu eu não experimenta sensações’—ele deveria ser perguntado: ‘Amigo, onde não há absolutamente nada para ser sentido, a idéia “Eu sou” poderia ocorrer?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

Por conseguinte, Ānanda, devido a isso não é aceitável que se pressuponha: ‘A sensação não é o meu eu; meu eu não experimenta sensações.’

“Ānanda, aquele que diz ‘A sensação não é o meu eu, mas o meu eu não está sem a experiência da sensação. Meu eu sente; pois o meu eu está sujeito à sensação’—ele deveria ser perguntado: ‘Amigo, se a sensação cessasse completamente e totalmente sem deixar nenhum vestígio, então, com a completa ausência de sensações, com a cessação das sensações, a idéia “Eu sou isso” poderia ocorrer?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

Por conseguinte, Ānanda, devido a isso não é aceitável que se pressuponha: ‘A sensação não é o meu eu, mas o meu eu não está sem a experiência da sensação. Meu eu sente; pois o meu eu está sujeito à sensação.’

“Ānanda, quando um bhikkhu não pressupõe a sensação como sendo o eu e não pressupõe o eu como desprovido da experiência das sensações e não pressupõe: ‘Meu eu sente; pois meu eu está sujeito às sensações’—então, sem ter essas pressuposições, ele não se apega a nada no mundo. Não se apegando, ele não fica agitado. Sem estar agitado, ele realiza Nibbana. Ele compreende que: ‘O nascimento foi destruído, a vida santa foi vivida, o que deveria ser feito foi feito, não há mais vir a ser a nenhum estado.’

“Ānanda, se alguém dissesse de um bhikkhu, cuja mente foi dessa forma libertada, que ele possui a idéia de que ‘Um Tathāgata existe após a morte’—isso não seria apropriado ou se ele possuir a idéia de que ‘Um Tathāgata não existe após a morte’—isso não seria apropriado; ou se ele possuir a idéia de que ‘Um Tathāgata tanto existe como não existe após a morte’—isso não seria apropriado; ou se ele possuir a idéia de que ‘Um Tathāgata nem existe, nem não existe após a morte’—isso não seria apropriado. Porque? Tendo o conhecimento direto da extensão da designação e da extensão dos objetos de designação, da extensão da linguagem e da extensão dos objetos de linguagem, da extensão da conceituação e da extensão dos objetos de conceituação, da extensão da sabedoria e da extensão dos objetos da sabedoria, da extensão na qual o ciclo gira: tendo o conhecimento direto disso o bhikkhu está libertado. Dizer que—'um bhikkhu que está libertado, tendo o conhecimento direto disso, não sabe e não vê, é a sua opinião'—não seria apropriado.

As sete estações da Consciência

“Ānanda, existem essas sete estações da consciência e duas bases. Quais são as sete?

“Existem, Ānanda, seres que são diversos no corpo e diversos na percepção, tais como os seres humanos, alguns devas e alguns seres nos planos inferiores. Essa á primeira estação da consciência.

“Existem seres que são diversos no corpo mas idênticos na percepção, tal como os devas do cortejo de Brahma que são gerados através do primeiro jhana. Essa é a segunda estação da consciência.

“Existem seres que são idênticos no corpo mas diversos na percepção, tal como os devas do Abhassara. Essa é a terceira estação da consciência.

“Existem seres que são idênticos no corpo e idênticos na percepção, tal como os devas do Subhakinna. Essa é a quarta estação da consciência.

“Existem seres que, com a completa superação das percepções da forma, com o desaparecimento das percepções do contato sensorial, sem dar atenção às percepções da diversidade, consciente de que o ‘espaço é infinito,’ entram e permanecem na base do espaço infinito. Essa é a quinta estação da consciência.

“Existem seres que, com a completa superação da base do espaço infinito, consciente de que a ‘consciência é infinita,' entram e permanecem na base da consciência infinita. Essa é a sexta estação da consciência.

“Existem seres que, com a completa superação da base da consciência infinita, consciente de que ‘não há nada,’ entram e permanecem na base do nada. Essa é a sétima estação da consciência.

“A base de seres não perceptivos e a base da nem percepção, nem não percepção—essas são as duas bases.

“Por conseguinte, Ānanda, se alguém compreende a primeira estação da consciência, aquela dos seres diversos no corpo e diversos na percepção e se ele compreende a sua origem, a sua cessação, a sua gratificação, o seu perigo e a sua escapatória, é apropriado que ele busque prazer nisso?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

“Se alguém compreende as demais estações da consciência … a base dos seres não perceptivos … a base da nem percepção, nem não percepção e se ele compreende a sua origem, a sua cessação, a sua gratificação, o seu perigo e a sua escapatória, é apropriado que ele busque prazer nisso?”

“Com certeza não, venerável senhor,”

“Ānanda, quando um bhikkhu—tendo compreendido como na verdade é a origem, a cessação, a gratificação, o perigo e a escapatória em relação a essas sete estações da consciência e as duas bases—está libertado através do desapego, então ele é chamado de um bhikkhu libertado através da sabedoria.

As oito libertações

“Ānanda, existem essas oito libertações. Quais são as oito?

Possuindo forma, ele vê a forma: essa é a primeira libertação. Não percebendo a forma no interior, ele vê a forma no exterior: essa é a segunda libertação. Ele está decidido apenas pelo belo: essa é a terceira libertação. Com a completa superação das percepções da forma, com o desaparecimento das percepções do contato sensorial, sem dar atenção às percepções da diversidade, consciente que o ‘espaço é infinito,’ ele entra e permanece na base do espaço infinito: essa é a quarta libertação. Com a completa superação da base do espaço infinito, consciente de que a ‘consciência é infinita,' ele entra e permanece na base da consciência infinita: essa é a quinta libertação. Com a completa superação da base da consciência infinita, consciente de que ‘não há nada,’ ele entra e permanece na base do nada: essa é a sexta libertação. Com a completa superação da base do nada, ele entra e permanece na base da nem percepção, nem não percepção: essa é a sétima libertação. Com a completa superação da base da nem percepção, nem não percepção, ele entra e permanece na cessação da sensação e percepção: essa é a oitava libertação.”

“Ānanda, quando um bhikkhu alcança essas oito libertações na seqüência para diante, na seqüência para trás e em ambas as seqüências, para diante e para trás; quando ele as alcança e emerge delas quando quiser, do modo que quiser e por quanto tempo quiser e quando, com a eliminação das impurezas mentais, ele permanece num estado livre de impurezas com a libertação da mente e a libertação através da sabedoria, tendo conhecido e manifestado isso para si mesmo no aqui e agora, então ele é chamado de um bhikkhu que está libertado de ambas as formas. E, Ānanda, não existe outra libertação de ambas as formas mais elevada ou mais sublime do que essa.”

Isto foi o que o Abençoado disse. O Venerável Ānanda ficou satisfeito e contente com as palavras do Abençoado.